4.ª ENCANTADAS DA CANÇÃO GAÚCHA
30, 31/10 e 01/11/2009
Santana da Boa Vista - RS
Composição premiada como "A Mais Popular", por indicação do público.
PRETA VELHA BENZEDEIRA
Todo mundo conheceu
Tia Vergínia, a benzedeira
na centenária existência
fez o bem a vida inteira
um dia partiu, serena
esse espirito de luz
pra ser um anjo no céu
junto à Maria e Jesus
(Refrão)
Preta velha benzedeira
dos males das criaturas
suas mãos foram instrumentos
de um divino dom de cura
Benzia cobreiro brabo
quebranto e mau olhado
sapinho na piazada
torção e osso quebrado
sem pedidos, nada em troca
rezava com devoção
a crença na benzedeira
foi costume e tradição
Refrão...
E agora que estás, mãe preta
junto de Nosso Senhor
será que podes pedir
uma graça, por favor
nossa gente anda sofrida
com tantas desilusões
mande mais fé e esperança
mais amor nos corações
Refrão...
Nota: Apresentação disponível no youtube - acesso pelo título PRETA VELHA BENZEDEIRA.
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FICHA TÉCNICA:
Autor da letra: Moacir Donato; Música/Melodia: João Paulo Garcia; Ritmo: Milonga;
Intérprete: Arthur N. Garcia; Músicos: Adriano Garcia e João Paulo Garcia (violões);
Roger Silva (contrabaixo); Tácito Fagundes (percussão - carron).
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DADOS BIOGRÁFICOS
VERGÍNIA OLIVEIRA DA SILVA (Tia Vergínia)
Nasceu em 06/06/1902, em Santana da Boa Vista, na localidade Costa do Valeiro, falecendo em 01/08/2007, com 105 anos de idade. Aos 5 anos perdeu a mãe, sendo criada pela avó Regina. Foi casada com o Sr. Francisco Nascimento da Silva (Tio Chiquinho), de quem ficou viúva. Teve 3 filhos: Alfredo e Ana Regina (falecidos) e Márcia da Silva Domingos, que dedicou-lhe cuidados nas últimas décadas de vida. Teve ainda 2 filhos de criação: Lourdes e Joel (Jader).
Tia Vergínia trabalhou na roça, em artesanato de lã, foi cozinheira em bailes de campanha e auxiliar de parteira. Desde muito cedo, exercendo o oficio transmitido pela mãe ou avó, ficou conhecida como "benzedeira", sendo muito requisitada e respeitada nesta atividade. Com o falecimento de Tia Vergínia, perdeu-se uma das últimas benzedeiras da região e, com ela, uma parte expressiva do costume e tradição das rezas de benzedura.
A homenagem prestada com esta composição, além do registro e resgate de um importante aspecto dos costumes e tradições regionais, além dos implícitos contidos na "Crônica da Vida", costitui o reconhecimento à figura e história de "Tia Vergínia", "uma pessoa do bem". Em síntese, esta homenagem traduz, segundo o autor, "um simples gesto de amor".
Crônica publicada no CLARIM SANTANENSE (Ed. Novembro/2007)
CRÔNICA DA VIDA
Moacir Donato
(Crônica apresentada na abertura do Programa Comunidade & Cidadania,
na Rádio Santana, dia 04.08.2007).
Nesta primeira intervenção no Programa Comunidade & Cidadania, quero fazer um registro, uma reflexão, numa espécie de crônica da vida. Sim, esta reflexão fala da vida e tem inspiração num fato ocorrido esta semana em nossa comunidade, o falecimento da Tia Vergínia, encerrando uma passagem de 105 anos neste plano.
Mas não vou falar de morte... Esta reflexão tem como foco a vida. E analisando a vida das pessoas observamos que:
Algumas conquistam poder, respeito e notoriedade, enquanto outras passam quase despercebidas por este mundo...
Alguns conquistam ou impõem respeito pelo seu poder econômico... Outros conquistam o poder politico...
Muitos alcançam o respeito pelo conhecimento adquirido ou atingem o sucesso por suas habilidades nas artes ou nos esportes.
Mas e aqueles que não têm poder econômico, não alcançam o poder político, não detém o conhecimento das letras e das ciências e não fazem sucesso nas artes ou nos esportes, como alcançarão respeito?
Nós tivemos a felicidade e o privilégio de conviver com uma pessoa simples, humilde, de poucas letras, nascida no início do século passado, muito provavelmente filha de escravos, que nunca teve fortuna, nem poder, nem sucesso, mas conquistou um respeito unânime das diversas gerações que compartilharam de sua longa vida.
E como? Simplesmente fazendo o bem, usando um dom que lhe foi transmitido pelos costumes e tradições, talvez por sua mãe ou avó.
Quantas dezenas ou centenas de pessoas, ao longo dessas décadas, buscaram alívio, conforto, esperança, nas benzeduras da Preta Velha Benzedeira? E ali, exercendo seu dom, com muita fé, foi benzendo nervo torcido, osso quebrado, cobreiro brabo e outros males.
Com todas as pessoas com quem falei, ainda antes de sua passagem, constatei um profundo respeito. Algo quase místico. Por isto falo de VIDA e de RESPEITO.
Sua voz era segura, seu gesto firme, mas suas feições eram serenas e meigas, transmitindo paz, segurança e bênçãos. Ainda agora recordo sua imagem serena quando a visitei no último sábado.
Não estou aqui lamentando sua morte ou simplesmente registrando uma perda. Desejo, isto sim, solidarizar-me aos familiares com esta mensagem de conforto. Tia Vergínia cumpriu sua missão. Fez o bem. Conquistou merecido respeito e agora segue seu curso como um espírito iluminado, deixando a todos nós, no vazio de suas bênçãos, o espaço para uma reflexão sobre a vida e seus verdadeiros valores.